A Aposta Tech de US$160Bi de Warren Buffett

E os melhores investimentos em tecnologia da história

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Oi, pessoal! Todos somos investidores. Nosso papel é entender como alocar recursos finitos para gerar os melhores resultados possíveis. Isso vale para tudo na vida: dinheiro, atenção, tempo, esforço e amor. Por isso, estudar os melhores investidores e as apostas que fizeram é essencial. No mundo da tecnologia, há investimentos lendários cheios de lições. Listei alguns dos principais neste artigo, mas hoje quero focar em um só: o investimento de Warren Buffett na Apple, que gerou um retorno de US$160Bi.

Caso tenha apenas um minuto:

  • Warren Buffett investiu mais de US$36 bilhões na Apple aos 86 anos, após ser convencido por seus dois gestores mais jovens. A aposta rendeu mais de US$160 bilhões para a Berkshire Hathaway.

  • Mesmo sem entender de tecnologia, Buffett reconheceu na Apple as mesmas qualidades que sempre valorizou: marca forte, fidelidade, efeito de rede e margens altas — um monopólio disfarçado.

  • O investimento só foi possível porque Buffett manteve uma mente de aprendiz, disposto a ouvir, delegar e agir fora de sua zona de conforto, mesmo depois de décadas de sucesso.

  • O maior diferencial não foi a análise, mas a convicção para alocar capital em escala. Muitos viram o mesmo cenário. Quase ninguém agiu com a mesma coragem.

O Melhor Investimento de Tecnologia da História

Toda vez que alguém diz que algo é “o melhor” ou “o maior de todos” na internet, está basicamente convidando para o debate. Esse é o jogo online, onde o engajamento cria fortunas — e destrói reputações. A lista dos maiores investimentos em tecnologia, considerando ganhos de capital de pelo menos US$70Bi, inclui:

Fonte: Bits, Stocks & Blocks

Esses cálculos foram feitos por mim, com base em premissas e estimativas. Usei o podcast do Acquired como ponte de partida. Talvez valha um post no LinkedIn explicando como cheguei a esses números.

Não incluí investimentos de fundos de venture capital. O investimento do Benchmark no Uber, da Accel no Facebook, da a16z na Coinbase e da Sequoia no WhatsApp estão entre os melhores da história. Mas nenhum passou dos US$70Bi em ganhos.

Vale fazer uma distinção importante entre dois tipos de investimento: Alocação Estratégica de Capital e Seleção de Ativos.

  • Alocação Estratégica de Capital: é a capacidade de direcionar grandes volumes de capital para oportunidades de longo prazo com vantagem estrutural. Não se trata só de comprar ações no mercado. Envolve adquirir negócios inteiros, setores ou estruturas que geram valor com consistência. M&As e investimentos incubados se encaixam aqui.

  • Seleção de Ativos: é a habilidade de escolher ações com desempenho acima da média. Essas ações podem ser de empresas listadas ou privadas, sem sinergia com o grupo investidor. Os investimentos em Apple e Arm são dois exemplos.

Cada um dos investimentos listados tem uma história fascinante. Masayoshi Son, do SoftBank, disse que apostou no Alibaba sem olhar os números — confiou em Jack Ma. O Facebook comprou o Instagram por um valor considerado absurdo, com menos de 20 funcionários e quase nenhuma receita. O mesmo aconteceu com o YouTube. Mas hoje, quero falar sobre a aposta de Warren Buffett na Apple — porque ela traz aprendizados raros.

O Melhor Investidor da História

Em maio deste ano, aos 94 anos, Warren Buffett anunciou sua aposentadoria. Ele passará o cargo de CEO da Berkshire Hathaway para Greg Abel no fim do ano. Buffett assumiu a fabricante de têxteis Berkshire Hathaway em 1965 e a transformou em um conglomerado de US$1,1 trilhão nos 60 anos seguintes. De 1965 a 2024, a Berkshire entregou um retorno acumulado de +5.502.284%, contra +39.054% do S&P 500.

Retorno Acumulado da Berkshire Hathway versus o S&P 500

A vida me ensinou que resultados extraordinários surgem da junção de vários fatores. Ninguém repetirá o desempenho de Buffett na mesma escala. Ele entendeu o mercado de ações dos EUA quando poucos sabiam o que estavam fazendo. Depois, surfou o vento de cauda da nação mais rica da história, com um mercado de capitais em expansão contínua, abastecido por investidores cada vez mais ricos do mundo inteiro.

Sua vida pessoal e trajetória profissional não foram perfeitas. Mas, em sua defesa, ele nunca se disse perfeito.

Que Não Sabia Investir em Tecnologia

Buffett nunca foi considerado um especialista em tecnologia. Ele não tem computador no escritório e enviou pouquíssimos e-mails na vida.

Só começou a usar um iPhone em 2018, quando Tim Cook, CEO da Apple, lhe deu um de presente.

Enquanto o setor de tecnologia é dominado por jovens, Buffett investiu na Apple aos 86 anos, quando a empresa já tinha mais de 40 anos e valia US$550Bi.

Mesmo sendo amigo pessoal de Bill Gates, ele sempre evitou investir em tecnologia.

Círculo de Competência

Buffett popularizou muitos conceitos de investimento, incluindo o “círculo de competência”. Ele escreveu sobre isso pela primeira vez na carta aos acionistas da Berkshire Hathaway de 1996:

O que um investidor precisa é da capacidade de avaliar corretamente negócios selecionados. Note a palavra 'selecionados': você não precisa ser um especialista em todas as empresas, ou mesmo em muitas. Só precisa saber avaliar empresas dentro do seu círculo de competência. O tamanho desse círculo não é o mais importante; saber os seus limites, sim.

O círculo de competência de Buffett inclui bancos, seguros, jornais e bens de consumo. Ele sempre reconheceu que não entendia tecnologia.

Em 1967, disse: “Sei tanto sobre semicondutores ou circuitos integrados quanto sobre os hábitos de acasalamento de um besouro polonês. Não investiremos em negócios em que a tecnologia seja difícil de entender ou essencial para a decisão de investimento.”

Ele também admitia que essas empresas poderiam ser ótimas, com crescimento acelerado. Mas preferia negócios em que pudesse ter mais certeza do resultado. Para ele, empresas de tecnologia podiam ser excelentes ou medíocres — e isso aumentava o risco.

Experiências Ruins

Buffett também acumulou um histórico ruim com investimentos em tecnologia:

  • Microsoft: Em 1986, comprou algumas ações após o IPO, apenas para se aproximar da empresa. A mãe de Bill Gates fez a ponte entre os dois, que criaram uma ótima amizade. Mesmo assim, ele nunca ficou confortável. Gates tentou ensiná-lo, levando diversos executivos para explicar o funcionamento da empresa. Não adiantou.

  • Amazon: Apesar de entender o varejo, Buffett não conseguiu prever a escala que a empresa alcançaria, nem acreditou que Jeff Bezos conseguiria construir algo tão dominante.

  • Google: Mesmo com a Geico, seguradora da Berkshire, sendo um dos maiores anunciantes do Google, Buffett não percebeu a força do negócio de busca.

  • IBM: Em 2011, investiu US$10Bi na empresa. Acreditava que, por ser uma fornecedora tradicional de tecnologia para grandes empresas, haveria barreiras para sua substituição. Estava errado. Perdeu US$2Bi nos sete anos seguintes.

Sócios Complementares

Durante quase 50 anos, Buffett e Charlie Munger lideraram os investimentos da Berkshire Hathaway. Munger, que faleceu em 2023, foi o responsável por mudar a filosofia do sócio. Antes focado apenas em ações baratas, mesmo que ruins, Buffett passou a buscar negócios excelentes a preços justos.

Warren Buffett e Charlie Munge

Essa mudança moldou a Berkshire moderna. Ele dizia que Munger era o “arquiteto”, enquanto ele mesmo era o “empreiteiro”.

Pensando na sucessão, Buffett e Munger trouxeram dois gestores de hedge funds: Todd Combs e Ted Weschler. Combs entrou na empresa após ligar diretamente para Munger e conquistá-lo em um café de horas. Já Weschler venceu dois leilões beneficentes para almoçar com Buffett, gastando mais de US$5 milhões no processo. Acabou recebendo um convite para se juntar à Berkshire. Desde o início, os dois tiveram autonomia. Começaram com US$2Bi cada e hoje administram cerca de US$30Bi. Não precisam da aprovação de Buffett para operar.

Foram eles, inclusive, que o convenceram a investir na Apple.

Warren Buffett, Ted Weschler e Todd Combs

Conselhos de Buffett para Tim Cook

Em 2012, um ano após assumir como CEO da Apple, Tim Cook enfrentava um bom problema: dinheiro demais. O caixa da empresa era de US$97Bi no início do ano e já somava US$121Bi em setembro — um crescimento de 24%. No mesmo período, as receitas também cresciam 49%. Mesmo com investimentos pesados em Capex e inovação, sobrava dinheiro todo mês.

Cook não conhecia Buffett, mas conseguiu seu telefone e ligou, com cara de pau. Buffett atendeu e foi direto: “Se você acha que sua ação está desvalorizada, deve recomprá-la.” Outros investidores também sugeriam o mesmo. Cook implementou a ideia pouco depois. Recompras são uma forma inteligente de alocar capital. São flexíveis (ao contrário dos dividendos), aumentam o lucro por ação e demonstram confiança da gestão. Mas isso não mudou a opinião de Buffett.

No entanto, na reunião anual da Berkshire em 2012, ele disse que jamais compraria Apple ou Google porque “simplesmente não sabia como avaliá-las”.

Monopólio Disfarçado

Os dois novos gestores da Berkshire chegaram à conclusão de que a Apple era um bom investimento, cada um por caminhos diferentes. Weschler começou a comprar ações em 2016. Para ele, a Apple tinha construído com o iPhone o tipo de empresa que a Berkshire sempre procurou: um monopólio. A lista abaixo mostra os principais negócios de monopólio que a Berkshire já investiu:

Fonte: Sparkline Capital

Depois que o usuário adota um iPhone, ele armazena fotos na nuvem, se acostuma com os atalhos e com o sistema. Isso cria fidelidade. Na hora de trocar de celular, ele quer outro da Apple. A taxa de 30% cobrada sobre vendas na App Store, já discutida aqui no bsb, só reforça isso. A Apple entrou para a lista de empresas monopolistas favoritas da Berkshire. Já Combs chegou à Apple por outro caminho. Buffett o desafiou a encontrar uma ação no S&P 500 que atendesse a três critérios: múltiplo preço/lucro de no máximo 15 vezes, alta previsibilidade de lucros maiores nos próximos cinco anos, e ao menos 50% de confiança de que o lucro cresceria mais de 7% ao ano por cinco anos ou mais.

A triagem de Combs apontou para a Apple, a mesma ação que Weschler já estava comprando.

A Hora de Puxa o Gatilho

Tim Cook e Buffett

Em 2016, aos 86 anos, Buffett refletiu sobre o trabalho dos seus dois gestores e tomou uma das decisões mais importantes da sua carreira. Nos dois anos seguintes, comprou mais de US$36Bi em ações da Apple. A empresa seguiu crescendo em todas as frentes, e seu programa de recompra de ações reduzia o número de papéis no mercado. Isso aumentava, automaticamente, a participação da Berkshire. Desde 2012, a Apple já recomprou mais de US$700Bi em ações. No auge, a Berkshire chegou a deter 5,4% da Apple — uma fatia avaliada em US$160Bi. Essa foi a maior posição da empresa, representando entre 20% e 25% do valor de mercado do conglomerado, dependendo do preço da ação. Buffett chegou a dizer que a Apple era “o melhor negócio do qual já fui sócio” e frequentemente elogia Tim Cook publicamente.

E O Momento de Vender

Saber comprar é importante. Mas saber vender também é. Buffett começou a reduzir sua posição em Apple em 2024, realizando cerca de US$85Bi em lucro. A Berkshire ainda mantém 2% da empresa. Ele não vendeu no topo, mas chegou perto. O preço médio das vendas foi de US$185 por ação. O papel chegou a US$250 e hoje está em torno de US$210. Buffett admitiu que vendeu cedo demais. Foi um erro.

Aprendizados

Mente de Aprendiz

Muitos investidores, especialmente os bem-sucedidos, caem na armadilha do ego e da rigidez com o tempo. Buffett não. Aos 86 anos, já com uma trajetória lendária e um portfólio bilionário, ele manteve o que os psicólogos chamam de growth mindset — a disposição de continuar aprendendo. Em vez de desprezar a tecnologia por estar fora de sua zona de conforto, ele se permitiu escutar, entender e agir. Essa humildade intelectual é, por si só, uma vantagem competitiva rara.

Aprender com o Novo 

Buffett sempre valorizou a convivência com pessoas inteligentes e confiáveis. Com Todd Combs e Ted Weschler, ele mostrou uma outra faceta do seu talento: a capacidade de delegar, escutar e absorver aprendizados vindos de gerações mais novas. Ao permitir que seus tenentes investissem na Apple, ele não apenas transmitiu responsabilidade — ele também foi influenciado por eles. Um lembrete de que os melhores líderes são também os melhores ouvintes.

O Mundo Rima

A Apple era uma empresa de tecnologia, mas se comportava como os monopólios que Buffett sempre admirou. Verticalizada, com marca forte, fidelidade absurda, efeito de rede e margens altas. Ele não mudou de estilo. Apenas percebeu que a tecnologia estava começando a parecer com os velhos negócios que ele entendia: Coca-Cola, American Express, Gillette. Ele viu através da “casca tecnológica” e identificou a essência de um monopólio de consumo.

A Genialidade nos Momentos Decisivos

Talvez o ponto mais subestimado da história. Não basta identificar um bom investimento — é preciso agir com convicção. Buffett alocou mais de US$36Bi em Apple. Foi sua maior posição. Um movimento audacioso, mas embasado. Ele reuniu os dados, ouviu as pessoas certas, refletiu e puxou o gatilho. Muitos viram o mesmo cenário, mas poucos tiveram coragem de agir com tamanha magnitude. O sucesso vem menos da análise e mais da ação.

Grande abraço,

Edu

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