Para onde a Inteligência Artificial está caminhando

E as primeiras vencedoras

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Oi, pessoal! Fazem quase três anos desde o surgimento do ChatGPT. Esse momento é visto por muitos como o Dia D da Inteligência Artificial.

Passado esse primeiro período, entramos agora em uma era em que os primeiros mercados de IA se consolidaram e temos um provável grupo de vencedores.

Isso não significa que outros competidores não aparecerão ao longo do tempo, ou que os líderes atuais não perderão sua liderança.

Já vimos isso, como no caso da Stripe, que foi lançada mais de uma década após o PayPal, e o Facebook, que surgiu alguns anos depois do Myspace e Orkut.

Entender os mercados mais desenvolvidos nos ajuda a identificar novas oportunidades. Também reflito sobre por que algumas indústrias adotaram IA mais rapidamente que outras.

Caso tenha apenas um minuto:

  • Os primeiros mercados de IA já têm líderes claros: Model Labs (OpenAI, Anthropic, etc.), jurídico (Harvey, EvenUp), atendimento ao cliente (Sierra, Nubank) e programação (GitHub Copilot, Cursor) são os segmentos mais consolidados até agora.

  • Capacidade técnica e capital são as maiores barreiras: O mercado de LLMs tende à concentração. A competição real está migrando para modelos fundacionais de nicho (voz, biociências, vídeo) e para quem constrói em cima desses modelos.

  • Agentes autônomos vão transformar serviços: No atendimento ao cliente e na programação, já há sinais claros de que arquiteturas baseadas em agentes — que tomam decisões e executam tarefas sozinhos — vão mudar como empresas operam.

  • Consumo é o próximo grande mercado: Apesar do ceticismo dos VCs, as maiores oportunidades estão em consumo — IA aplicada a comércio, relacionamentos, autoexpressão e novas interfaces promete criar os próximos gigantes.

Mercados Desenvolvidos

Atualmente, temos os seguintes mercados relativamente maduros:

  1. Laboratórios de Modelos

  2. Jurídico

  3. Atendimento e Experiência do Cliente

  4. Programação

1) Laboratórios de Modelos

Os laboratórios desenvolvem modelos para uma vasta gama de aplicações. Além dos modelos de linguagem (LLMs), há arquiteturas para voz, imagem, vídeo, música, química, biologia, materiais e física. Esses modelos dependem de escala: dados, poder computacional e técnicas de ajuste fino. Escala também significa dinheiro. Para disputar os LLMs, é preciso muito capital, agora na casa dos bilhões.

O setor está se consolidando em poucas empresas. Elas se alinham com gigantes da nuvem: Amazon com a Anthropic, Google Cloud com o Gemini, e Microsoft Azure com a OpenAI. Esta última também tem um projeto próprio de data centers, tema para outro artigo.

O incentivo desses parceiros não é apenas retorno direto. A motivação também é aumentar o consumo de nuvem com IA, independentemente da performance financeira das startups. Hoje, o campo dos LLMs gira em torno de OpenAI, Anthropic, Google, Microsoft e X.AI. Elas tomam mercado de empresas menores. Sou cético quanto ao futuro de competidores como Mistral.

A Meta tenta voltar ao grupo com aquisições e pagando luvas milionárias para contratar pesquisadores seniores. Algumas ofertas chegaram a US$ 100 milhões por profissional.

Antiga liderança da OpenAI. Da foto, dois deixaram a empresa e criaram compeditores: Ilya Sutskever (à esquerda) e Mira Murati (no meio)

Existem novas tentativas como SSI e Thinking Machine Labs, criadas por mentes técnicas de primeira linha. Algumas podem surpreender com abordagens diferentes, garantir rodadas generosas ou ser absorvidas por players maiores.

Na China, projetos de código aberto como Deepseek, Alibaba Qwen e Kimi têm mostrado bons resultados. Estou planejando uma viagem para pesquisar esse ecossistema. Tema para outro artigo. Além destes, é improvável que novos nomes ganhem força. A barreira de capital está alta. A menos que surja uma inovação disruptiva que não se espalhe rápido, o campo tende à concentração. Há, no entanto, oportunidades em outros modelos fundacionais: biociências, voz e vídeo.

2) Jurídico

Entre os setores impactados pelos LLMs, o jurídico teve adoção rápida. Nos EUA e países de common law, a Harvey lidera em grandes escritórios e departamentos corporativos. Outras startups focam nichos: EvenUp (danos pessoais), DoNotPay (multas), Eve e Supio (rotinas de advogados). Ainda não existe um advogado 100% IA. A automação total ainda engatinha. Mesmo assim, já há sistemas que executam o trabalho jurídico de forma sequencial e estruturada, com pouca intervenção humana. Harvey e EvenUp são pioneiras em montar esses fluxos. O direito é vasto: patentes, contratos, trabalho, fusões, contencioso. Atende multinacionais e autônomos. Ainda existem espaços não tocados. Com certeza, há oportunidades.

No Brasil, a Enter é um exemplo. Primeira investida da Sequoia Capital no país em 12 anos, quer transformar como os advogados lidam com ações de massa. Em vez de mais uma ferramenta pontual, a Enter quer refazer todo o fluxo operacional, eliminando redundâncias e reduzindo o atrito entre times. A tese é aplicar IA antes mesmo da petição inicial. Se fosse apostar, diria que a Enter vai expandir para outras áreas de serviços.

3) Atendimento e Experiência do Cliente

O desafio aqui é transformar métricas como NPS em diferencial competitivo. Clientes esperam respostas rápidas e coerentes. Falhas reduzem fidelidade. Excelência aqui impacta marketing boca a boca, marca e custo operacional.

Nos EUA, o setor vive uma concentração temporária. Decagon e Sierra, esta última fundada por Bret Taylor (Chairman da OpenAI), são os destaques. Zendesk corre para incorporar IA e fazer upsell.

Material da Sierra

Outros nomes menores exploram nichos ou se destacam pela técnica. Este é um setor com maior abertura para Agentes: IAs que substituem humanos com sistemas autônomos. Eles tomam decisões, interagem e concluem tarefas.

Na parte de cobrança, startups estão mudando o modelo de precificação: de assento para resultado ou interação. Empresas devem mudar como precificam, escalam e medem valor. Tema para outro texto. A infraestrutura para agentes autônomos está evoluindo. Os modelos estão melhores. É questão de tempo.

No Brasil, grandes techs estão internalizando IA no atendimento:

  • Mercado Livre: usa o Verdi, camada baseada em GPT-4o, para tratar 10% dos atendimentos de forma autônoma. Também cataloga produtos, resume avaliações e detecta fraudes com alta precisão.

  • Nubank: implantou um copilot na central de atendimento. Reduziu tempo de resposta em 70% e resolveu 55% dos chamados de primeiro nível com GPT-4o. Usa IA interna para resumir conversas e buscar em bases de conhecimento.

  • iFood: usa chatbots 24h para perguntas frequentes e repassa casos complexos com o histórico organizado. IA também atua na logística e personalização.

4) Programação

Talvez devesse estar no topo da lista. O código foi uma das primeiras aplicações de IA generativa a escalar. Antes mesmo do ChatGPT, em outubro de 2021, o GitHub Copilot já era usado por milhares de devs. Tinha limitações, mas entregava valor. Linguagens são estruturadas, com sintaxe clara e intenção explícita. Ideais para IA que aprende com grandes volumes de dados.

O impacto cultural e econômico é enorme. O empreendedorismo digital ficou mais acessível com o "vibe coding": escrever ideias em linguagem natural e ver a IA transformar em código.

Crescimento de diferentes empresas até atingirem US$100M de ARR

Empresas como Cursor estão crescendo em ritmo impressionante. Poucas lideram: Claude Code da Anthropic, Windsurf (comprada pelo Google), Cursor, Microsoft/GitHub e OpenAI. Fora do eixo, há Replit, Lovable e outras menores focadas em experiências mais fluidas e lúdicas. Canva e Figma também lançaram ferramentas de geração de código. A dúvida é: essas soluções serão definitivas? E talvez os modelos absorvam as funcionalidades dos copilotos.

Os próximos mercados

Nos próximos meses, acredito que IA ganhará tração em: Contabilidade, Compliance, Financeiro, Vendas e Segurança. A pergunta que empreendedores e investidores devem fazer é: por que a adoção de IA não decolou com a mesma velocidade do que nos mercados citados anteriormente? Penso em três razões:

Tecnológica: os modelos de IA ainda não chegaram no nível de sofisticação necessário. Por exemplo, a Harvey só foi possível devido ao GPT4.

Go-to-market: talvez o custo de mudar de uma ferramenta pior, mas já integrada seja muito alto. Ou os compradores são lentos. Talvez as startups estejam vendendo errado.

Empreendedor: talvez a pessoa certa para dominar um setor simplesmente ainda não apareceu.

A Joia da Coroa: Consumo

Robo para Consumidores da Startup Andromeda

Um setor está totalmente em aberto. E pode gerar os maiores retornos. Todo fundo de VC brasileiro diz preferir B2B. Mas as Três Triunfantes da América Latina são de consumo: Mercado Livre, iFood e Nubank.

Nos EUA, as maiores techs são de consumo: Apple, Amazon, Google e Meta (Microsoft é exceção). Os maiores IPOs da década também foram: Uber, Airbnb e DoorDash. Mesmo assim, o desânimo com consumo persiste. Na última turma da Y Combinator, só 4 de mais de 100 startups eram B2C.

Apesar do entusiasmo com IA para empresas, o maior potencial está no consumo. IA vai revolucionar como compramos, aprendemos, nos comunicamos e nos relacionamos. O comércio assistido por IA é promissor: estilistas automatizados, recomendadores com contexto emocional, interfaces conversacionais. Tudo mais fluido e personalizado.

Outra frente são os companheiros de IA: apps que funcionam como terapeutas, conselheiros ou parceiros afetivos. Há também criadores digitais: avatares, clones de voz, vídeos gerados por IA. Qualquer um pode virar uma mídia. Isso abre um mercado para expressão, games e social.

E surgem interfaces nativas de IA: apps que nascem com foco em chat, voz e interações com agentes. A tese é simples: se a IA vai mediar tantas interações humanas, os produtos que capturarem esse espaço serão os grandes vencedores da década.

Estamos só começando!

Grande abraço,

Edu

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